segunda-feira, 17 de abril de 2017

Fagulha



Nunca quis que fosse agressão. Falo sobre essas coisas que escrevo e publico. Tenho dificuldade de dizer oralmente as coisas. Por essa razão, decidi escrever para e sobre mim hoje. Não tem amor, não tem balela, não tem conto erótico.

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Eu sei que eu tenho essa carcaça bonita. Eles dizem que eu tenho um sorriso adorável e todos acham meu cabelo esquisito atraente. Cria-se essa ideia descolada plastificada sobre quem eu sou. Essa identidade falsa autenticada baseada em umas fotos de ângulos estratégicos, meia dúzia de roupas legais e um monte de tatuagens espalhadas pelo corpo. Preciso deixar registrado que sou apaixonada por quem existe dentro de mim. Essa alma que fica escondida atrás de um borrão escuro desesperador. Essa pessoa que entende ser enganada pela construção do amor e, ainda sim, pretende viver intensamente um. 

Há onze anos escrevo sobre como me sinto e como enxergo o mundo. Criei esse esconderijo onde deposito tudo aquilo que me pesa os ombros de alguma maneira. Onze anos e ainda existe esse abismo fodido entre quem transita dentro de mim e quem as pessoas acham que eu sou. De vez em quando eu choro até os pulmões doerem. Em determinado momento – que não sei mencionar exatamente qual -, parei de existir ao redor alheio.  Fui me afastando aos poucos, como quem pega uma alergia e quando vê está em estado terminal. Já morri tantas vezes que não suporto mais estar de luto. 

Ando triste. Talvez eu esteja mesmo procurando por qualquer canto quentinho onde eu possa desmoronar. Tento não deixar tanto em evidência as minhas inseguranças. Metade de mim acha que eu falho miseravelmente e a outra metade acende um cigarro mantendo o plano. A verdade é que a minha carcaça bonita começou a morrer também. Tentei procurar ajuda mais por ser o que as pessoas esperam que eu faça do que por estar interessada em ser ajudada. É só que eu me sinto como se todas as crianças tivessem ido brincar na neve nos quintais completamente esbranquiçados e eu estivesse olhando pela janela porque meus pais não me deixaram ir. De repente, naquele determinado momento da minha vida, alguém me deu um bandão e acho que perdi as duas pernas – ficou essa síndrome do membro fantasma, esse estar de pé com a certeza flamejante de que não tem nada te segurando ali mais. 

Sei que embaixo dessa teia enorme cheia de trejeitos, palavrões e vícios, existe uma criatura mística amarela de cabelos lilás e olhos cor de avelã; sem grilos, sem gritos, sem grifos. Não sei por qual razão ela não abre a tampa desse pote com um mundinho dentro e deixa transbordar só um pouco do lado de fora. Essa criatura mística que vos fala perdeu a fagulha – tão rápido como quem quer falar de si mesmo, mas é só ir ali à cozinha acender um cigarro no fogão que a vontade passa.

quarta-feira, 1 de março de 2017

Lâmpadas, gênios e três pedidos ordinários


(caso queira, cê pode ler ouvindo essa música) Eu lembro dos seus papos sobre aquela serpente, ouroboros; sobre como a gente continua no mesmo espiral de sempre, repetindo os mesmos erros de ângulos diferentes. Não importa quanto tempo passe, eu continuo morrendo. Meu planeta entrou em colapso e há muito finjo estar segurando as pontas. Já não consigo dizer quem sou e nem sinto a resposta no céu da minha boca.

Ainda sinto que expectativa é um sentimento bosta, mas continua sendo sobre lâmpadas, gênios e três pedidos ordinários. Eu volto pro luto, cê volta pra isso que eu não sei dizer o que é, mas que sem descobrir direito já me baqueou. O que restou foi ouvir City and Colour na poltrona, fumando maconha e pensando em todas as coisas que não precisam mais ser ditas.O mais difícil é desapegar das noites de conchinha, dos encontros rotineiros às duas da madrugada e do formato dos dentes caninos.

Todos os dias que passam é menos um dia para chegar o tarde demais. Tive medo por você. Criei esse pedestal que me ergue e não entendi nada. Tomei um soco na auto estima e me desfiz inteira. Não quero mais dizer que foi sua culpa. Até uva passa, continuo insistindo nessa merda. Não sei como começar, mas terminar tem sido o meu maior obstáculo.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Banhos, amassos e suor

(caso queira, você pode ler ouvindo essa música a partir dos 13 segundos)

Imagina só a gente numa casinha de hobbit, perdido num canto bem longe do mundo, transando vinte e quatro horas por dia todos os dias da semana. Imagina a quantidade de banhos, amassos e suor, transbordando pela chaminé de um lugar tão miúdo, mas que encaixa certinho. Intimidade demais faz a gente se sentir meio porn star e, particularmente, acho ótimo. Foi amor, mas também foi conto erótico.
A sensação é de que eu cheguei numa festa maravilhosa e me satisfiz rebolando a noite inteira. Acho que é desse cigarrinho que eu mais sinto falta.

Cê vai e volta, enquanto eu deixo passar todas as oportunidades de te chamar pra fugir; não faz mais sentido, embora a gente viva se resgatando pra matar uma saudade que ninguém quer largar mão. Dói, mas é gostoso. Dói, mas é sempre uma aventura com gosto de "nunca mais é o caralho".

domingo, 29 de janeiro de 2017

Dicas de filmes para mães/pais

Eu nunca fui uma pessoa de assistir filmes com crianças ou temas relacionados à maternidade. Essas coisas passam a nos interessar, acredito eu, quando de fato precisamos criar um ser humano. Afinal de contas, qual é a melhor maneira de se educar outra pessoa? Será mesmo que nossas críticas sobre o mundo são infundadas? Será que nós é que estamos no caminho errado e vamos acabar transformando tudo em um grande equívoco? Não sei.

Baseado nas coisas que desejo para nina, com certeza uma alimentação livre dessas porcarias que eu adoro e garrafas de três litros de refrigerante, prática constante de esportes, corpo e mente saudáveis, o máximo de conhecimento possível, fazem parte de uma lista que parece não ter fim e que a pessoa que EU sou ainda não consegue fazer tudo isso. Ter filho é pensar diariamente no sistema, no capitalismo, nos perrengues no fim do mês e em como eles surtem efeito na vida daquela criança; é se olhar no espelho e saber que, enquanto eu não mudar minha rotina e meus hábitos, não tenho moral pra querer que minha filha faça diferente - mesmo que isso queira dizer que é melhor. Por causa disso, passei a me cobrar mais. Parei de fumar não por causa de mim, mas porque não quero que Nina o faça, por exemplo. Quero começar a me alimentar de forma saudável, caminhar e correr pelas manhãs, não gastar extremamente mais do que o necessário, ler mais, etc. Juntei forças para ignorar os palpites alheios, porque mãe não pode nem pisar fora de casa que já perguntam da cria, né?

Sem muita demora, gostaria de dizer que não copio e colo sinopses, a forma como descreverei é completamente pessoal. São dois filmes completamente diferentes. Um deles retrata a fase inicial, sentida principalmente pela mulher, e o outro a criação, a evolução, as dificuldades do cotidiano.

JUNO
Juno é uma menina de dezesseis anos que não se compreende como pessoa. Ela se faz acreditar numa visão dela mesma que não é real, como se fosse necessário convencer a si mesmo que tudo o que você considera um acontecimento positivo, foi só porquê você insistiu muito e não por você ser uma pessoa legal e que merece. Juno engravida e precisa ver seu corpo gerar outro, suportar outro. É um filme sobre muita força, embora também seja sobre descobertas, maturidade, grandes decisões. 

(Você pode assistir esse filme na Netflix)

Capitão Fantástico
É um filme sobre um casal/pai que decide fugir do sistema e criar seus filhos de outra maneira. Eles só comem comida orgânica, possuem físicos de atletas de elite, são uns esquisitos no que diz respeito a pessoas urbanas como nós. Só que fugir do sistema é como criar uma pequena bolha imaginária, uma redoma, pra te proteger: você ainda está conectado com tudo aquilo que está do lado de fora, mas não sabe interagir. É um filme sobre quebrar conceitos, traçar estratégias, entender extremidades, criar significados para família, ceder.

                             (Esse filme pode ser assistido LEGENDADO no youtube)
 

sábado, 28 de janeiro de 2017

Onde não dói

É muito difícil começar sem um cigarro na mão. Acho que tem a ver com a pessoa que eu era, justamente porque eu fumava. Acho que é por isso que é difícil parar. A gente se acostuma com uma personalidade onde aquele negócinho fosse um super poder para n coisas dentro da nossa alma. Parei, foda-se, a pessoa que eu sou agora quer dormir mais cedo e caminhar pela manhã. Eu fui sombras, madrugada, insônia, fast food; agora eu quero me alimentar melhor, tomar menos refrigerante, experimentar ter unhas grandes. 

Precisei parar de me aborrecer com os detalhes, ao contrário de simplesmente trocar a direção do olhar - se você já assistiu Blue Jasmine, cê sabe do que eu tô falando.Fiquei furiosa tanto tempo que comecei a passar fome de outros sentimentos. Não da pra dizer que não me estremeceu, mas é que até a minha carcaça precisava de uma folga. Te amo de longe onde não dói. Tomara que cê consiga me amar de volta daí.

domingo, 15 de janeiro de 2017

Caderninho




Os últimos dias foram intensos mesmo, mal deu pra digerir o furacão. Parece que a nossa ponte interplanetária quebrou e a gente ficou preso cada um num lado. O futuro é essa mata sinistra só porque vou ter que entrar nela sozinha. Acho que existe vida após a morte, porque eu continuo existindo por aí. A sensação é de que eu tinha esse caderninho, feito uma pequena agenda, e nele eu escrevia tudo aquilo que sou; aí eu abri as páginas dele e cê amou, mas não era isso tudo.

Ficou esse vácuo dentro do peito difícil de explicar. Como se eu precisasse declarar estado de calamidade para não acabar catando cavaco em direção ao buraco e me perder por lá. Se saudade fosse uma pessoa, ela teria a sua feição. Das coisas que me trazem alegria, uma delas é saber que cê foi meu primeiro amor. Das que são carregadas de tristeza, a certeza é de que o fim do amor é o fim da gente.

Praia segura ou mar revolto?

Mergulhei. Nadei. Me perdi. Agora não sei qual direção tomar. Praia segura ou mar revolto? 

Gritei aos quatro ventos que queria calmaria. Menti. Menti de novo. Menti tanto pra ver se eu mesmo acreditava. Sou feito furação, preciso estar sempre lutando para dominar essa tempestade de sentimentos. Muitas vezes falho. Falhei ontem e continuo tentando remediar essa falha. 

Relutei. Não queria ir. Opostos demais. Fui. Era para ser bonança. Me envolvi. Virou temporal. Corri e mergulhei. Buscava ali, no fundo das águas escuras, uma proteção. Me encolhi e prendi a respiração até o peito queimar. Não suportei. Emergi. Estava sozinha na tão sonhada calmaria. Doeu. Aquela não era eu. Segurei o choro e fingi que estava tudo bem. 

Engoli o orgulho e me revesti de coragem. Enfrentar velhos medos é sempre uma guerra. A pintura a óleo ainda estava lá, mas já não tinha o mesmo brilho. Esfriou e a culpa foi minha. Nadei tanto contra a correnteza que acabei sozinha em alto mar. Agora não sei qual direção tomar. Posso voltar para as tão sonhadas águas seguras ou mergulhar na tormenta. Há riscos em buscar o que me fez fugir? Doce contradição.